domingo, 18 de janeiro de 2009

O estigma das drogas

São dois os principais estigmas – sinais, marcas – a que a comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros) está submetida. O da promiscuidade e o do uso de drogas. Sobre a promiscuidade já tivemos a oportunidade de falar um pouco. Hoje, gostaria de abordar a relação entre gays e drogas.
Pesquisa recente desenvolvida pela Universidade de Pittsburg sobre esta relação aponta números alarmantes. Jovens gays, lésbicas e bissexuais estão 190% mais propensos a usarem substâncias ilícitas do que os jovens heterossexuais da mesma idade. Entre os bissexuais, o número sobe para 340%, e entre as jovens lésbicas, para 400%.
Um atenuante é o fato de drogas lícitas, como tabaco e álcool, terem sido consideradas no estudo. Mas, mesmo assim, os números são de deixar qualquer um “bege” ou chocado (sem ignorar os que defendem o uso de drogas).
A homofobia e a discriminação são apontadas como responsáveis pelo uso das substâncias pelos jovens estudados. Além de tabaco e álcool, estão incluídas maconha, cocaína, anfetamina e drogas injetáveis. Os responsáveis pela pesquisa entendem que, historicamente, grupos marginalizados ou oprimidos, sem as mesmas oportunidades ou direitos, sofrem intensamente.
Os números apresentados na pesquisa foram obtidos através do cruzamento de 18 estudos realizados entre 1994 e 2006 com organizações de apoio a jovens gays e usuários de drogas.
Quase tudo que envolve os gays parece questionável. Talvez porque realmente o mundo seja visto de várias formas por diferentes pessoas. Nada é definitivo e alguns assuntos polêmicos são escancarados neste meio. Vejamos.
As raves e clubes eletrônicos parecem tomados de gays cheios de bala na cabeça, mas muitos homossexuais não usam nenhum tipo de droga, nem as lícitas.
Um fato importante para tentar esclarecer tudo isso é que no surgimento da Aids, os os grupos em que o vírus HIV se disseminou mais rapidamente foram os gays e os viciados em drogas injetáveis. Com o tempo, este quadro mudou, mas novamente as estatísticas mostram que os gays e os usuários de drogas apresentam um crescimento vertiginoso de novas infecções.
As drogas muitas vezes fazem parte de um ritual de auto-afirmação, que compensa limitações e potencializa prazeres. Sob o fascínio das luzes e das sirenes nas boates, gays se jogam em fantasias e se arriscam em cena. Deixe de ser “lesado”. Se liga!

Turismo gay: destinos e cuidados


Janeiro é mês de férias para muita gente. Nada melhor do que falarmos a respeito de alguns destinos e de alguns cuidados a serem tomados nas viagens.
Se for viajar pelo Brasil, três são os destinos mais solicitados pelo público LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros) gastar seu “pink money”: São Paulo, Rio de Janeiro e Florianópolis.
Conhecer São Paulo é ter a oportunidade de desfrutar de uma vida noturna fervidíssima e agregar a isso arte, culinária e compras. São casas noturnas, bares e cinemas, entre outros estabelecimentos voltados para o público gay. Para quem esta sozinho ou acompanhado, prefere o dia ou a noite.
O Rio de Janeiro, “Cidade Maravilhosa”, continua sendo a alegria de turistas do mundo todo, em especial do turista LGBT. Praias deslumbrantes, arquitetura, rico acervo cultural e histórico e uma infinidade de estabelecimentos gays, entre saunas, bares e boates. O principal point continua sendo Ipanema, para ver e ser visto.
Floripa é o destino certo para encontrar as “bonitas”. Cercada por praias, dunas, fortes e palácios, a capital catarinense oferece uma variedade de opções para se divertir, também tanto de dia quanto de noite. Destaque para as praias Mole (a mais freqüentada por gays) e ao seu lado Galhetas (praia de nudismo).
Este ano, acontece o primeiro cruzeiro gay brasileiro. Será em fevereiro e irá de Santos a Florianópolis. Uma festa em alto mar para quase 2 mil pessoas.
Aqueles que optarem pelo exterior, têm ótimos destinos tanto mais longe, inclusive em outros continentes, quanto aqui perto, na América do Sul mesmo.
Buenos Aires (Argentina) é uma cidade de padrão europeu que oferece cultura, lazer e muita ferveção. Temos também Santiago (Chile) e Punta del Este (Uruguai).
Na América do Norte, a dica é São Francisco (EUA), centro do movimento pelos direitos homossexuais. Animadíssima cidade da Califórnia, conhecida por sua vida cultural intensa, é destino livre de preconceitos.
E no Velho Continente, a “Cidade Luz” Paris, com boa cozinha, muita cultura e moda. O bairro de Marais, no centro, tem a maior concentração de estabelecimentos voltados para o público LGBT.
Seja qual for a escolha, o importante é sempre procurar se certificar de fatos e de eventos. Confirmar cada informação pelo menos três vezes. É comum alguém dizer que um lugar “X” fica a um quilômetro para a direita, quando na verdade está a uma quadra à esquerda. Ao aventurar-se, tome cuidado. Preste muita atenção nos comportamentos dos habitantes locais. Cautela não faz mal a ninguém. E se joga, gente!
* Foto da cidade do Rio de Janeiro.

Um breve balanço

2008 chega ao fim e o momento é propício para refletirmos sobre os fatos do ano. Prefiro destacar os bons acontecimentos. Não que seja fácil, nem que dê certo todas as vezes.
Principalmente neste espaço, que vejo como extremamente positivo, quero salientar as coisas legais. Já são quatro meses de coluna “G, L e o quê?!”, este cantinho pioneiro na região que tem a pretensão de falar mais diretamente aos integrantes da comunidade gay, mas não se contenta só com isso e quer envolver todo mundo nas reflexões.
Mas vamos a alguns fatos que abalaram a cena, seja nas capitais ou aqui mais pertinho da gente. Há quem fale em momento histórico para o movimento LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros) no Brasil. Durante conferência em Brasília, no mês de junho, um presidente pela primeira vez levantou a bandeira do arco-íris. No caso Lula, abrindo a 1ª Conferência Nacional GLBT e defendendo o combate ao preconceito.
No país com mais paradas gays (cerca de 100) e com o maior destes eventos no mundo (se São Paulo não for a maior, está entre as maiores), este é um capítulo à parte. A Parada Gay paulistana reuniu em maio deste ano 3,5 milhões de pessoas, que gritaram “Homofobia Mata – Por um Estado laico de fato!”, pedindo a aprovação do projeto de lei que criminaliza qualquer tipo de discriminação quanto à orientação sexual dos indivíduos.
Próximo à nossa região, Rio Preto sediou em julho o “I Fórum do Noroeste Paulista para Homossexuais Masculinos e Femininos”, com a presença de aproximadamente 200 pessoas, discutindo Direitos Humanos e Homossexualidade. O evento integrou-se à 8ª Parada GLSBT de Rio Preto “Um mundo, um sonho: sem fronteiras, sem discriminação e sem homofobia”, que reuniu 13 mil, com diversas caravanas de cidades vizinhas.
É o arco-íris além das grandes cidades, que também brilhou em Bauru e sua primeira “Parada pela Diversidade”, em setembro, com aproximadamente 5 mil pessoas.
Na área jurídica, a decisão de maior importância foi a proferida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), reconhecendo, em votação apertada, que as uniões homoafetivas devem ser julgadas em varas de família. Alguns companheiros conseguiram o direito de receber pensão decorrente de falecimento. Casais puderam partilhar seus bens em razão de rompimento da relação.
No Estado de São Paulo, a Lei nº. 10948/2001 vem sendo cada vez mais utilizada, aplicando-se penas àqueles que praticam atos homofóbicos. Nossos julgadores estão mais habituados a proferir decisões favoráveis ao segmento, na medida em que recebem mais e mais processos envolvendo a busca pelos direitos à dignidade e igualdade.
Para finalizar, gostaria de destacar também a abordagem do tema preconceito contra homossexuais na novela A Favorita (Rede Globo). A força da novela brasileira a favor da mudança de comportamento. Uma exposição respeitosa e responsável do assunto pelo autor João Emanuel Carneiro.
É isso aí pessoal. Que em 2009 tenhamos muito mais a comemorar. Xô urucas. Que o próximo ano seja tudo de bom, seja de arrasar para todos nós: G, L, B, T, S e tantos mais!

* Material escrito em 23.12.08.

Gays e mercado de trabalho


Mais difícil que assumir a homossexualidade para os pais talvez seja sair do armário no trabalho. Afinal, é neste ambiente que garantimos nossa subsistência e ninguém quer correr riscos de perder o emprego ou perder oportunidades de crescimento dentro da empresa.
Mas homossexualidade é motivo para demissão? Já foi bem mais, mas ainda é, infelizmente. Mesmo com toda a cultura do politicamente incorreto estabelecida em nossa sociedade. O que diferencia um profissional homossexual de um heterossexual? Não há diferença.
É claro que cada caso é um caso, como quase tudo na vida. Entre as diversas profissões, existem as mais conservadoras e as mais liberais. Existem aquelas que são taxadas de profissões de gays (e coitados dos héteros que as escolhem também). Outras são insuspeitas, mas estão cheias de gays praticando.
O governo desenvolve políticas e apóia ações que promovam a igualdade de direitos e combatam a discriminação contra segmentos historicamente vulneráveis como mulheres, negros, portadores de deficiência, idosos e homossexuais, entre outros. Mas as dificuldades continuam.
Algumas notícias no mundo corporativo são bastante positivas. Cada vez mais, grandes empresas investem na diversidade como estratégia de negócios. Apenas para citar uma importante, a IBM teve seu primeiro grupo voltado para o segmento criado em 1995. A companhia vende por ano US$ 500 milhões no mundo em produtos e serviços para mulheres, minorias e clientes LGBT. A opção sexual, em casos como este, pode até se tornar um ativo na hora de pleitear um cargo.
Quando uma empresa aceita as pessoas como elas são, quem está confortável dentro da companhia trabalha melhor e a fuga de talentos é menor.
Mas mais importante que isso é verificar o quanto a sexualidade pode interferir na escolha da profissão direta ou indiretamente e pode afetar a realização no trabalho. Alguém pode ter escolhido ser médico porque só assim conseguiu o reconhecimento e o respeito que julgava não ter em razão de sua orientação sexual. É preciso resgatar a auto-estima e usá-la da melhor maneira tanto fora quanto dentro do trabalho.
Mesmo com todas as dificuldades e obstáculos, é importante que os gays tenham o direito de viver suas vidas livremente e a liberdade de escolher sua profissão. E que ninguém seja gongado (derrubado)!

Maníaco do Arco-íris e os perigos da pegação


Um suposto serial killer de homossexuais pode estar atuando no Parque do Paturis, em Carapicuíba, na Grande São Paulo. A notícia foi divulgada nacionalmente na última semana. O suspeito já teria feito 13 vítimas atraídas por sexo rápido. O local é uma típica área de “pegação” gay.
Pegação é um termo associado à pratica sexual anônima entre gays, sem compromisso, geralmente em lugares públicos, como banheiros, parques e praias. No Brasil, lugares como o Parque do Ibirapuera em São Paulo e as Trilhas de Galheta em Florianópolis são referências internacionais.
Os crimes de Carapicuíba ocorreram entre julho de 2007 e agosto deste ano, praticamente um por mês, mas até agora não tinham despertado a desconfiança das autoridades policiais, mesmo com o fato de as vítimas todas serem homossexuais, terem sido encontradas no mesmo local, com as calças abaixadas e de bruços e terem sido mortas com tiros, com exceção de uma a pauladas. A maioria das vítimas é de classe média e média baixa, sendo funcionários públicos, um detetive, um barman e um caminhoneiro.
O apelido de Maníaco do Arco-íris é uma referência à bandeira colorida dos gays e lésbicas. A dificuldade em elucidar o caso está no fato de a polícia contar com apenas uma testemunha para construir o retrato-falado e conseguir mais pistas sobre a identidade do homem. Com o caso divulgado, espera-se que apareçam pessoas que tenham visto o maníaco ou que tenham sido abordadas por ele.
Mas é justamente o anonimato que impera nestes tais locais de pegação e que podem ser campo fértil para desajustados psiquicamente. Anonimato de muitos que não querem expor seus desejos. Que têm vergonha dele. É triste que nossa sociedade ainda viva esta situação.
Às escondidas, não há como pedir socorro. Muitos também se sentem impedidos de ajudar nas investigações em nome de se manter no anonimato. Especialistas avaliam que o maníaco provavelmente é homossexual e que mata gays para tentar reprimir o seu impulso sexual.
Tudo isso expõe o fato de que muitos indivíduos ainda não aceitam sua própria sexualidade.
Há quem defenda que se destinem espaços específicos para a caçação (o ato de fazer pegação). Muitos criticam o uso de lugares públicos para esta finalidade. Faltam locais apropriados para a intimidade dos homossexuais? Não parece haver a discussão necessária para a destinação de espaços dignos. Perdura uma situação uó de tolerância enrustida, que reforça o estigma de que gay vive em locais sujos para saciar seu instinto desviante.

* Material escrito em 10.12.08.

O gogo boy e o desejo


Corpão, músculos definidos, pele bronzeada, apenas uma sunga, óleo no corpo e bota de couro. O gogo boy é outra figura marcante da cena gay. Rara até bem pouco tempo na região, agora aparece com mais freqüência em boates e festas. A gogo girl também tem marcado presença.
É o ápice da fantasia do corpo perfeito, a inspiração exacerbada do erotismo e do desejo. Na atualidade consumista, é o prato ideal para sempre querer mais e nunca se satisfazer. Já dizia o psicanalista francês Jacques Lacan: “O sujeito não satisfaz simplesmente um desejo, mas goza por desejar, e essa é uma dimensão essencial de seu gozo”. Resume bem a relação do homem com o desejo. Ele é o único animal que não deseja exatamente coisas, deseja desejos, goza pelo fato de desejar.
Ainda segundo Lacan, o desejo tem caráter “vagabundo, fugidio, inapreensível”. É manifestação de um vazio que quer consumir os objetos, mas não se satisfaz com eles. Vai de um para o outro e nunca pára.
Para citar um autor mais recente, Zygmunt Bauman fala que o desejo não deseja satisfação, ao contrário, deseja o desejo. Ao analisar o consumidor numa sociedade de consumo como a nossa, ressalta que o mesmo é um acumulador de sensações.
Em meio a estes desejos e sensações é que vive o gogo boy. Por definição, homem que dança em estilo provocante. Nada mais.
Alguém que tem que ser liberal. Não deve se incomodar se alguém estender as mãos e tocar qualquer parte de seu corpo. Em alguns casos hétero – casado e até com filhos – em outros gay, comprometido ou não. Algumas vezes michê (garoto de programa).
A verdade é que na maioria dos casos se ganha pouco com as apresentações em cima do queijo (pequeno palco redondo em boates). Eles têm que se virar com outras profissões, geralmente ligadas à área esportiva – professor de academia, por exemplo.
Enquanto alguns preferem usar eufemismos para falar sobre o que fazem, como “trabalho com dança” ou “sou artista da noite”, muitos falam da satisfação de se exibir.
Também sofrem preconceito. Seja por que trabalham na noite ou até mesmo pela idade. Sim, com os 30 anos chegando, eles já não têm tanta chance de exibição. As casas noturnas preferem gogo’s cada vez mais jovens.Há quem diga que eles são exploradores do público LGBT. Que alguns fazem cara feia quando são elogiados ou cantados por gays. Estes devem se limitar então a dançar em clubes específicos para mulheres ou nos chás de cozinha. Não podemos contribuir para o aumento do preconceito.
Que os gogo boys e girls continuem animando as pistas. Ao lado das drags, promovam o entretenimento. Se joga, gente!


* Foto do gogo boy Petter Rionche, que atua na região de Araçatuba.